Por que não reativar a Cobal? Imprensa hegemônica, aliada do mercado, está empenhada em pressionar governo por cortes em investimentos e Banco Central por alta dos juros, e não preocupada de fato em combater o problema
Por Wagner de Alcântara Aragão (@waasantista) | De Santos (SP) e Curitiba (PR)
Desde a penúltima semana de janeiro, o noticiário da imprensa hegemônica – isto é, dos grandes portais, jornais e canais de televisão – tem explorado a alta no preço dos alimentos.
É que, à ocasião, o IBGE divulgou a prévia da inflação daquele mês.
Foi baixíssima, de apenas 0,11%, um terço da verificada em dezembro (0,34%).
Só que, especificamente no grupo de alimentação, o aumento de preços foi considerável: 1,06%.
Bastou para um alarde sem fim – reportagens de rua em feiras, economistas do setor financeiro apavorados e apavorando, comentaristas reproduzindo clichês.
Nenhuma análise mais profunda sobre as razões, menos ainda sobre soluções que signifiquem de fato um enfrentamento do problema.
Muito pelo contrário. O que se viu em análises como as da Globo foi criticar, antecipadamente, qualquer movimento mais incisivo do governo para por freios na alta.
Por que?
Porque na verdade o noticiário da imprensa hegemônica se aproveitou dessa alta pontual para, a serviço do mercado financeiro, seguir no seu ativismo por corte de gastos do governo e aumento de juros pelo Banco Central.
Fica evidente todo um discurso e uma insistência em cobranças no sentido de fazer a opinião pública crer que, “bem, é isso, não tem saída”: para conter a inflação, só mesmo com taxas de juros altos e governo cortando recursos das políticas públicas – para, na prática, garantir que sobre dinheiro para gastar com os juros da dívida pública (dinheiro que vai para o sistema financeiro).
Se a maior parte das reportagens, os economistas ouvidos, os analistas de bancada estivessem mesmo preocupados em discutir medidas que não sacrifiquem mais ainda o povo para continuar enriquecendo especuladores, colocariam em pauta, por exemplo, a volta da Cobal.
A SUGESTÃO DA VOLTA DA COBAL
Cobal é o acrônimo para Companhia Brasileira de Alimentos. Foi criada em 1962 pelo governo trabalhista de João Goulart. Uma companhia para atuar no abastecimento de alimentos para o povo – não para concorrer ou destruir os mercados privados, sim para oferecer alternativas, preços mais acessíveis.
Nas décadas seguintes, as funções da Cobal se expandiram, com os chamados hortomercados, e até com unidades volantes – como o caminhão da foto que ilustra esta matéria.
Entre o início e meados da década de 1980, com a disparada da inflação os caminhões da Cobal garantiram e muito o acesso à comida por famílias brasileiras mais pobres, nos centros urbanos e sertões.
Em 1990, com o Brasil aderindo ao neoliberalismo e consequente destruição de importantes organismos estatais, a Cobal foi extinta.
Por que não resgatar sua concepção, atualizando-a aos tempos atuais?
Por que não ao menos começarmos a discutir?
Repare: o governo do presidente Lula nem chegou a mencionar uma medida como essa, mas só por ter esboçado uma postura minimamente pró-ativa, foi acusado pela repercussão da grande mídia de “cogitar intervencionismo”. Um sufocamento do debate para lá de arbitrário.
NÃO HÁ DESCONTROLE DA INFLAÇÃO HOJE
Frise-se que essa inflação dos alimentos apurada em janeiro tem nada de descontrole.
Decorre de problemas pontuais, sazonais, como subida do dólar e emergências climáticas.
Nem por isso não deve ser minimizada.
Mas, no lugar de alarde para fazer o jogo do mercado financeiro, o que precisamos é de medidas que atendam o povo.
PARA SABER MAIS SOBRE A COBAL:
- Artigo “A extinta Companhia Brasileira de Alimentos ainda pode ser uma boa opção?”, em Eu na História. Clique aqui
- Artigo “Morte e vida dos espaços públicos de sociabilidade: o caso Cobal no Rio de Janeiro”, de Ricardo Ferreira Lopes e Josielle Cíntia de Souza. Leia aqui
- Matéria “Cobal Humaitá e Leblon: há que esclarecer”, no Urbe Carioca. Ver aqui
Imagem em destaque: caminhão da Cobal, nos anos 1980, possivelmente. Não foi possível localizar autoria e origem da foto. Optamos por publicá-la assim mesmo pelo seu valor informativo, e teremos prazer em dar os créditos, em descobrindo-os
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