Monumento de Oscar Niemeyer em homenagem a sem terra está sob ameaça

Organizações reivindicam tombamento da escultura, localizada na BR-277, no município de Campo Largo (PR); relembre o que a obra representa


Da Assessoria de Comunicação da Terra de Direitos | De Campo Magro (PR)

Toda pessoa que dirige à Curitiba (PR) ou retorna da capital paranaense pela BR-277 se depara, na altura do quilômetro 108, em Campo Largo (PR), com um grande monumento às margens da rodovia.

De autoria do renomado arquiteto Oscar Niemeyer, a obra representa uma memória coletiva da luta pela reforma agrária.

No entanto, está ameaçado e, por isso, é objeto de medidas de proteção e tombamento.

A escultura foi construída em 2001, quando Oscar Niemeyer decidiu homenagear trabalhadores rurais sem terra violentamente reprimidos em 2 de maio de 2000, por ação da Polícia Militar sob o comando do então governador Jaime Lerner.

Naquela data, cerca de 50 ônibus com sem terra seguiam em caravana do interior do Paraná para a capital para participar da Marcha pela Reforma Agrária, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em comemoração ao Dia dos Trabalhadores.

Na BR-277, em razão de um bloqueio feito pela Polícia Militar do Paraná, os passageiros desceram de um dos ônibus para perguntar o que estava ocorrendo, quando policiais militares efetivaram sequenciais disparos contra os trabalhadores.

Era uma tropa com cerca de 1,5 mil militares, que utilizaram bombas, cavalaria, cães e armas letais.

O trabalhador rural Antônio Tavares foi morto. Mais de 185 sem terra ficaram feridos.

CESSÃO DO TERRENO

O monumento desenhado por Oscar Niemeyer foi erguido em um terreno particular. A empresa proprietária cedeu a área para a instalação da escultura.

Desde então, a obra tem sido mantida e preservada por esforços voluntários do MST e parceiros.

No entanto, a partir de 2016 a empresa proprietária do terreno tem manifestado interesse em removê-la do local.

COMO FUNCIONA

Segundo o contrato de comodato firmado entre a empresa e organizações sociais, o período de vigência da sessão seria de cinco anos. Antes do fim de cada período de cinco anos o contrato poderia ser rescindido por manifestação expressa. Caso as partes não se manifestem durante o período, a renovação do contrato é automática, por um novo período de cinco anos – durante o qual a cessão da área está assegurada.

A empresa tentou rescindir o contrato em fevereiro de 2016, mas notificou fora do prazo – após 21 de fevereiro – e já na vigência do novo período de cinco anos de validade do contrato, ou seja, até 2021.

Desde então tem sido uma decisão excepcional da Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), que tem assegurado a proteção ao monumento.

TOMBAMENTO

Diante de tamanha ameaça, para garantir a integridade do monumento e amparada na Constituição Federal e leis municipais sobre preservação da memória, organizações sociais solicitaram ao município de Campo Largo, em 2021, o tombamento da obra.

O processo administrativo ainda não foi finalizado, portanto não há decisão definitiva proferida.

Com processo administrativo instaurado, o Departamento de Cultura do município solicitou uma análise da Procuradoria Geral da Prefeitura e notificou a empresa cessionária do terreno onde a obra está instalada. A empresa, contudo, declarou não estar interessada em continuar com o contrato de comodato.

DENÚNCIA À CORTE DE DIREITOS HUMANOS

Na denúncia realizada à Corte Interamericana as organizações apontaram que a remoção do monumento descaracterizaria a obra e sua função, já que sua vinculação com o local específico onde se encontra é fundamental.

Além disso, traria consigo um risco de danos graves, inerentes a qualquer deslocamento de um bem cultural.

PEDIDO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Em 2016, o Ministério Público do Paraná já havia realizado pedido de tombamento do monumento ao Conselho Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico.

Contudo, o pedido de tombamento foi rejeitado a partir de parecer da Procuradoria Geral do Estado. Desde o momento de sua inauguração (1º de maio de 2001) o monumento ainda não passou por um reconhecimento do Estado ou ação efetiva, ampla e integral voltada para a sua proteção e manutenção.

DEPOIMENTOS

“Esse monumento tem uma importância não apenas simbólica do passado e da memória de violência, mas também é uma obra de arte. Como arte, ela pereniza a luta pela reforma agrária. E por é isso que as pessoas contrárias ao MST se incomodam ao ver o monumento”, enfatiza o professor de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Carlos Frederico Marés.

“É importante que aqueles que venham ou saiam da capital paranaense sintam um incômodo e questionem o porquê daquele monumento. Com ele, é criada uma rasura, um rasgo na história paranaense, uma história oficial que não reconhece a história de luta dos camponeses”, sublinha o professor de direito da Universidade Federal do Paraná, Leandro Gordsdorf.

“O monumento no Paraná se insere no conjunto de esculturas de protesto projetadas por Niemeyer. Elas representam um momento da redemocratização do Brasil, mas tratam de assuntos que continuam com ameaças ao estado democrático de direito e à vida das pessoas”, aponta o conselheiro do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Nivaldo Vieira de Andrade Júnior.

“O monumento traz presente um dos piores momentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e da violência contra a classe trabalhadora. A história não deve ser apagada. Por isso o monumento não deve ser destruído, para que nunca mais na história possa acontecer o que aconteceu com a gente ali, naquele momento”, destaca o integrante da direção do MST no Paraná.


Imagem em destaque: mobilização em torno do monumento desenhado por Oscar Niemeyer, em homenagem aos trabalhadores sem terra, na BR-277, em Campo Largo, região metropolitana de Curitiba.  Foto: Juliana Barbosa/MST-PR




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