Como a terceirização vai detonar a qualidade do serviço público

Atendimento em saúde, educação, assistência técnica e em repartições em geral poderá ser feito por pessoal ganhando menos, sem estímulo para formação continuada e sem os direitos trabalhistas básicos garantidos

Por Wagner de Alcântara Aragão (@waasantista) | De Curitiba (PR)

Já está em vigência desde segunda-feira, dia 24, um decreto federal que amplia para praticamente todas as atividades a terceirização no serviço público. A terceirização irrestrita abrange órgãos da administração direta, autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista controladas pela União.

O que uma atitude como essa significa, na prática?

O governo, por meio do Ministério do Planejamento, e os analistas do “mercado” têm enaltecido a medida. Todavia, tanto um lado como outro fazem a análise sob o ponto de vista meramente contábil. Omitem os efeitos que a terceirização desenfreada causam não só para a categoria dos trabalhadores do serviço público, como para a sociedade de um modo geral.

E quais são os efeitos?

A partir de duas reportagens – uma de Pedro Rafael Vilela, da Agência Brasil, e outra da Rede Brasil Atual – fizemos uma compilação dos principais prejuízos da terceirização do serviço público para a população brasileira. Confira:

MAIS TERCEIRIZAÇÃO, SERVIÇO MAIS PRECÁRIO

Com mais funções terceirizadas – o atendimento no posto de saúde, ou na UPA; o ensino na escola; os procedimentos em geral nas repartições públicas – o serviço passa a ser feito por pessoal sem carreira pública, portanto sem maiores vínculos, sem a possibilidade de capacitação e incentivos dos planos de carreira. Haverá mais rotatividade de pessoal, o que influencia diretamente na qualidade do serviço prestado.

A terceirização vai fazer também com que não sejam abertos mais concursos públicos. Além de ser uma forma mais transparente de contratação, o concurso público é uma forma também mais criteriosa.

Em nota, a Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Federal (Condsef), que representa mais de 80% dos trabalhadores no serviço público do Poder Executivo, reforça o entendimento de que o decreto (de número 9.507) tem “potencial para fragilizar ainda mais o setor público, que já vem sendo fortemente atacado”, conforme informa texto da Rede Brasil Atual.

TRABALHADOR PREJUDICADO

Na opinião do presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Guilherme Feliciano, o decreto reforça o temor da ampliação da terceirização no serviço público, que tende a ser desfavorável aos trabalhadores. Ele explica, em reportagem da Agência Brasil:

“O modelo de terceirização usualmente adotado no Brasil não é o modelo que privilegia o conhecimento técnico, mas aquele em que se ganha por meio do achatamento dos direitos sociais do trabalhador terceirizado. Isso já acontece em atividades-meio das estatais, como a Petrobras, onde os trabalhadores que mais sofrem acidentes são justamente os terceirizados”, sublinha.

MENORES SALÁRIOS, MAIS ACIDENTES

Estudo do Dieese mostra que os trabalhadores terceirizados ganham em média 25% menos, se acidentam 60% mais e trabalham 12 horas a mais por mês. A rotatividade da mão de obra também é o dobro da registrada em relação ao contratado direto.

Para a CUT, com o decreto, “os servidores públicos estarão sujeitos a redução de salários, aumento de jornada e no número de acidentes de trabalho – como ocorre na maioria dos setores que abusam do emprego de mão de obra terceirizada”, argumenta nota da entidade, que acrescenta: “o texto do decreto tenta disfarçar a terceirização ilimitada do serviço público federal ao listar algumas hipóteses com restrição à contratação de serviço indireto, como quando os serviços forem ‘considerados estratégicos para o órgão ou a entidade, cuja terceirização possa colocar em risco o controle de processos e de conhecimentos e tecnologias’”.

À Agência Brasil, o advogado Marcelo Scalzilli, sócio e coordenador da área trabalhista do Scalzilli Althaus Advogados, alerta que o atual decreto pode escancarar a terceirização no serviço público. “Nesse novo decreto, não existe mais de forma expressa quais são os serviços que poderiam ser terceirizados. Antes, isso estava especificado e abrangiam as chamadas atividades-meio, como limpeza e segurança. Nesse sentido, a nova regra abre brecha para ampliação das possibilidades de terceirização nos serviços públicos.”

SEM GARANTIA DE DIREITOS

O decreto do governo de Temer e partidos que dão sustentação ao governo golpista (PSDB, PSD, PP, Podemos, PTB) ainda chama atenção pela fragilidade da garantia dos direitos trabalhistas básicos – como o pagamento do salário – ao trabalhador terceirizado. “A responsabilidade da administração pública quanto à garantia dos direitos trabalhistas é anulada pelo decreto. O texto dispõe de cláusulas que deixam exclusivamente sob responsabilidade da empresa contratada o pagamento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e contribuições com o FGTS”, adverte matéria da Rede Brasil Atual.

“Na história da terceirização, o que mais existe é empresa de terceirização que dá calote nos trabalhadores. E se o trabalhador não tem a garantia da quitação dos direitos trabalhistas pela administração pública, vai sair com uma mão na frente e a outra atrás. E ninguém vai pagar por isso”, denuncia presidente interino da CUT Brasília, Rodrigo Rodrigues.

Imagem em destaque: atendimento à saúde em posto em São Paulo, hoje feito por servidores de carreira, mas que poderá ser terceirizado. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil


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