Os icônicos e sustentáveis trólebus de São Paulo sob ameaça

Empresa operadora retira veículos de operação da mais antiga linha do Brasil; risco é de que se recolha o restante da frota. Sistema da capital, do ABC e de Santos são os três únicos sobreviventes


Por Wagner de Alcântara Aragão (waasantista.bsky.social) | De São Paulo (SP)

Manhã de sábado. Agosto, 2025. Sol, céu azul, temperatura agradável. Cidade de São Paulo.

Pelas ruas do tradicional bairro de Higienópolis se vê, além dos edifícios de arquitetura modernista e praças bem cuidadas, a rede de cabos aéreos da mais antiga linha de trólebus do Brasil, a 408A-10.

Criada em 1947, a Machado de Assis x Cardoso de Almeida, como é chamada, até poucas semanas atrás foi operada por ônibus elétricos abastecidos por cabeamento aéreo – os trólebus propriamente ditos.

No entanto, por decisão da empresa privada operadora, a Ambiental, os trólebus da 408A-10 foram retirados de circulação. Foram substituídos por veículos elétricos a bateria.

Elétrico a bateria na 408A-10, quando deveria estar substituindo carros a diesel. Foto: @waasantista

O recolhimento teve o aval da Prefeitura de São Paulo.

Que, na prática, está promovendo uma seguinte situação absurda.

A situação é a seguinte: os ônibus elétricos, em vez de entrarem no lugar dos carros a diesel, estão colocando para escanteio outros veículos elétricos, tão ou mais sustentáveis e eficientes: os trólebus.

O fato tem sido denunciado por segmentos da sociedade, como especialistas em mobilidade urbana, portais dedicados ao tema, estudiosos, entusiastas do sistema e entidades em geral.

Por exemplo: um seminário envolvendo esse público, realizado no último dia 14 pelo Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (Seesp), denunciou o risco de extinção dos trólebus e demonstrou como alternativas tecnológicas tornam esses veículos mais viáveis e necessários do que nunca.

Já o movimento Trólebus Brasileiros, em seu perfil no Instagram tem feito campanha contra a medida argumentando o valor histórico e o potencial turístico.

E, caso a retirada dos trólebus paulistanos seja irreversível, pede que os veículos sejam incorporados por um dos outros dois sistemas sobreviventes, o de Santos (o outro é o metropolitano do ABC).

Outro movimento similar, o Ônibus de Santos, somou-se ao pleito dos Trólebus Brasileiros, reivindicando a manutenção dos trólebus em São Paulo e a reativação do sistema de Santos.

O sistema de trólebus de Santos, cuja malha chegou a abranger toda a zona da orla e boa parte das zonas leste e intermediária, hoje conta com apenas uma rede, a da linha 20, entre o Centro da Cidade e o Gonzaga, pela Avenida Ana Costa.

Contudo, os veículos, históricos, do tipo padron, fabricados em 1987 pela Mafersa-Villares, estão encostados na garagem da empresa privada concessionária, a BR Mobilidade Piracicabana (Comporte/ Grupo Constantino).

A Prefeitura de Santos promete que vai recolocar os trólebus históricos em circulação, porém não diz quando, nem explica bem por que seguem parados.

O trólebus Fiat Alfa Romeo Marelli Pistoiese, que circulou em Santos. Foto: Carlos Nogueira/ Prefeitura de Santos

Recentemente, adquiriu da família fundadora da Expresso Brasileiro um trólebus Fiat Alfa Romeo Marelli Pistoiese, que circulou em Santos entre 1963 e 1994. Há expectativa de que o carro recebe novo chassis e motor e seja colocado em operação também.

O sistema do ABC, operado pela Next Mobilidade (ex-Metra), abrange as cidades de São Paulo, Mauá, Santo André, São Bernardo do Campo e Diadema.

A frota de trólebus, moderna, roda por corredores exclusivos. É tido como o sistema de transporte mais bem avaliado em todo o Brasil (ver aqui).

Os trólebus começaram a ser implantados no Brasil no final dos anos 1940, em São Paulo. Nas décadas seguintes, foram adotados em cidades como Santos, Araraquara (saiba mais aqui), Ribeirão Preto (relembre aqui), Rio de Janeiro, Niterói, Porto Alegre, Salvador e Recife.

Trólebus na cor padrão EBTU, adquirido ao sistema de Santos dentro do programa federal de ampliação e modernização do sistema em cidades brasileiras. Foto: acervo CSTC

O auge dos sistemas ocorreu entre o final dos anos 1970 e meados dos anos 1980.

À época, para enfrentar a crise mundial do petróleo, o governo federal, por meio da Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU), financiou a modernização e expansão da frota e das redes.

A medida fortaleceu a indústria nacional (ver caso da Cobrasma).

Com exceção do sistema do Grande ABC, todos os demais deixaram de receber investimentos, e a quase totalidade foi sucateada e desativada.

Os de São Paulo, agora ameaçado, e o de Santos, suspenso, conseguiram resistir, ao lado do corredor metropolitano do ABC paulista.


Imagem em destaque: trólebus dos anos 2010, ainda em operação (agosto de 2025) na capital paulista. Até quando? Foto: @waasantista



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