Sem direitos básicos, 1,5 milhão de brasileiros trabalham para plataformas digitais

80% deles são informais; quase um terço só a serviço da Uber. Pesquisa da UFPR com Unicamp traz outros dados impactantes


Por Davi Macedo, do Brasil de Fato no Paraná | De Curitiba (PR)

No Brasil, 1,5 milhão de pessoas trabalharam em 2021 para as plataformas digitais. Desse total, cerca de 850 mil são motoristas de aplicativos de transporte de passageiros, dos quais 485 mil estavam em atividade para o Uber.

É o que mostra um estudo da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que também apurou a legislação e jurisprudências em torno dos direitos desses trabalhadores brasileiros.

O relatório, denominado ““O trabalho controlado por plataformas digitais no Brasil: dimensões, perfis e direitos”, foi produzido e publicado por pesquisadores da Clínica de Direito do Trabalho da UFPR, com participação também da Universidade de Campinas (Unicamp).

SEM DIREITOS TRABALHISTAS

A pesquisa aponta que 80% das pessoas que trabalham para essas corporações de tecnologia exercem suas atividades informalmente.

Ou seja, não têm acesso a direitos trabalhistas.

Em 2021, havia 1,5 mil aplicativos em operação no país.

Para o coordenador da Clínica Direito do Trabalho da UFPR, professor Sidnei Machado, essa situação precisa mudar.

“É fundamental que o trabalho controlado por plataformas seja associado aos direitos de cidadania no trabalho”, afirma.

LEI PARA PROTEGER

Machado defende uma lei protetiva que defina a relação de emprego, com as garantias de direito ao salário mínimo mensal, limite de jornada, descanso semanal, férias, acesso à Previdência Social.

“Deve-se responsabilizar a plataforma pelos custos do trabalho e o trabalhador ter direito à representação sindical, incluindo a negociação coletiva”, completa.

PESQUISA MULTIDISCIPLINAR

O projeto de pesquisa reuniu uma equipe multidisciplinar, com especialistas nas áreas do Direito, Economia e Sociologia, da UFPR e Unicamp.

Foram utilizados métodos mistos de análise de tráfego de web e de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Também foram aplicados questionários, respondidos por 500 trabalhadores de diversas profissões, além da realização de entrevistas em profundidade, levantamento de propostas legislativas e análise de conteúdo de decisões judiciais, com o objetivo de compreender o funcionamento desse modelo de negócio no Brasil e as relações de trabalho.

FALTAM MAIS PESQUISAS NO BRASIL

O professor destaca a invisibilidade brasileira no tema, já que as pesquisas se concentram nos países do hemisfério Norte.

“É um questionamento global. Fizemos essas pesquisas para contribuir com a produção de dados abrangentes no país”, assinala Machado, lembrando que o estudo fornece dados confiáveis sobre as plataformas digitais em funcionamento no Brasil.

O CASO DE GUSTAVO

Entre outros procedimentos, os pesquisadores entrevistaram 14 profissionais de diferentes áreas, que compartilharam suas experiências.

Um dos entrevistados foi o Gustavo (nome fictício), motorista de aplicativo, que vivencia cotidianamente uma jornada de trabalho de aproximadamente 13 horas.

Ele trabalha com a Uber e 99 no início da manhã e na volta para casa. Durante o dia, se dedica à Cornershop.

DO RAIAR DO DIA ATÉ 8 DA NOITE

“Eu costumo começar às 7 horas da manhã. Nesse horário eu pego algumas viagens pela Uber, que é para fazer o dinheiro da gasolina. A Uber você trabalha e recebe de imediato. A partir das 8 horas, eu começo com a Cornershop e vou até as 20 horas da noite. Daí eu costumo ligar o Uber e a 99 de novo no final do expediente, para voltar para casa, porque eles têm o recurso de direcionar as suas viagens”, conta Gustavo, que consegue fazer até R$ 200 reais por dia.

NA JUSTIÇA, DECISÕES A FAVOR DAS PLATAFORMAS, CONTRA OS TRABALHADORES

No campo jurídico, a pesquisa contemplou 485 decisões espalhadas pelas 24 regiões da Justiça do Trabalho, relacionadas às plataformas Uber, 99 Pop, iFood, Rappi, Loggi e Play Delivery.

Neste conjunto, 78,14% das decisões não reconheceram a relação de emprego, 15,88% não versaram sobre a existência de relação de emprego (sendo decisões sobre terceirização ou que não enfrentaram o mérito discutido) e apenas 5,98% das decisões reconheceram a relação de emprego entre trabalhador e plataforma.

O maior volume de judicialização se encontra nas plataformas de transporte urbano: Uber e 99 Pop.

O livro “O trabalho controlado por plataformas digitais no Brasil: dimensões, perfis e direitos” está disponível no site da Clínica Direito do Trabalho da UFPR. Acesse aqui.


Imagem em destaque: reprodução da capa do livro com o estudo. Divulgação UFPR




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