Brizolinha, um refúgio para a leitura

Ícone dos sebos em Santos, a banca de livros (boa parte raros) sobrevive à crise e à era da mídia digital, e preserva a memória do fundador, homenageado por Leonel Brizola

Por Wagner de Alcântara Aragão | Foto: @brizolinhalivros

Há quase três décadas atraindo apreciadores da leitura e sendo ponto de encontro de artistas e intelectuais seria tempo suficiente para fazer um empreendimento do ramo de livros se tornar referência em uma localidade. Mas a Brizolinha possui atributos mais, que o da longevidade.

Localizado há 20 anos no Gonzaga, bairro mais agitado de Santos – antes funcionou por algum tempo no Centro – o sebo em forma de banca de jornal tem histórias para contar que tornam aquele cantinho patrimônio imaterial do município, de seu povo e da gente que visita aquela que é uma das cidades que mais recebem turistas no Brasil.

Quem conta à Rede Macuco um pouquinho dessa trajetória é o atual empreendedor do Brizolinha, Guilherme Eduardo de Moraes Mancio. Ele é filho do fundador, Carlos Eduardo Motta Mancio, que morreu recentemente – em 23 de novembro último, aos 65 anos, vítima de um infarto.

Carlos Eduardo Motta Mancio era conhecido como “Brizola” ou “Brizolinha”, apelido que emprestou para a banca de livros – muitos deles dificilmente encontrados em outros lugares.

Sim, a referência vem de Leonel Brizola, herói da pátria desde 2015, pelo legado que deixou em sua vida pública. O filho Guilherme conta como surgiu o apelido:

“Era anos 80, se não me engano 1988, e meu  trabalhava com um vereador daqui de Santos. Aí, durante uma campanha política, meu pai estava no palco e o Brizola estava discursando. Ao fim do discurso, ele – não sei por que – acabou abraçando meu pai e dando um lenço que estava usando no pescoço. Aí já viu: começaram a chamar [meu pai] de Brizolinha.”

O apelido pegou, tanto que Carlos Eduardo Motta Mancio assumiu de vez a alcunha e com ela batizou sua banca de livros de segunda mão. Primeiro, a banca funcionou na Rua General Câmara com Rua Itororó, próximo à Prefeitura de Santos. Anos depois, como ocorreu com muitos outros estabelecimentos, a Brizolinha se mudou para o Gonzaga – bairro que se configurava como polo de comércio e serviços com mais força que o próprio Centro (que os santistas mais antigos chamam de “Cidade”).

A nova localização ajudou a tornar a “Brizolinha” ainda mais conhecida. Afinal, a banca passou a ficar na Rua Bahia, de frente para a Rua Cláudio Doneaux, via de intenso tráfego – forma um binário viário paralelo à orla da praia. Quem vinha pela Cláudio Doneaux de longe avistava o letreiro “Brizolinha” estampado na testa da banca.

Outro elemento visual fez com que a “Brizolinha” se transformasse em ícone do Gonzaga e de Santos: as ilustrações desenhadas pelo artista gráfico Argemiro Antunes, o Miro, nas laterais da banca. Os desenhos despertam a atenção principalmente das crianças.

Miro foi colaborador do também icônico jornal “O Pasquim”. Notabilizou-se ainda por ser especialista na obra do cineasta Glauber Rocha. O artista gráfico era muito amigo de Brizolinha, conforme conta Guilherme. Miro morreu cinco dias antes da morte de Brizolinha (leia aqui).

Segundo reportagem do jornal A Tribuna (ver aqui), a partida do amigo entristecera Brizolinha. O livreiro também lamentava a crise econômica, que diminuiu as vendas do negócio.

O filho Guilherme está tratando de manter a Brizolinha presente na vida dos santistas. De semanas para cá, criou um perfil do sebo no Instagram (@brizolinhalivros), onde vem compartilhando fotos do rico acervo da banca. Os tempos são de crise, e de concorrência com as mídias digitais, porém Guilherme sente soprar brisas de alento:

“Mesmo hoje com toda facilidade que o mundo digital proporciona, quem ama livro não o troca por nada; a pessoa gosta do velho e bom livro. O que mais vende é romance – seja em formato pocketbook ou livro [em tamanho convencional] mesmo. Depois vêm os clássicos, buscado por um outro público – geralmente pessoas mais velhas, intelectualizadas.” 

A Brizolinha, como dito, está na Rua Bahia com a Rua Cláudio Doneaux, no Gonzaga. Fica aberta de segunda a sexta-feira, das 10h30 às 18h30. De férias, de folga, ou a caminho do trabalho, ou de volta para casa, vale fazer uma parada ali, e mergulhar no universo dos livros, ver de perto páginas de história


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Um comentário sobre "Brizolinha, um refúgio para a leitura"

  1. O Brizolinha foi uma pessoa sempre bem humorada e pronto para qualquer conselho. Inteligência fora do normal e um senso crítico sempre afinado. Era um pai!!! Guilherme (seu filho) é uma ótima pessoa e está cuidando excelentemente da banca. Valeu muito a pena conhecer o local.

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