Por que as escolas cívico-militares são inconstitucionais. Por Sérgio Sérvulo da Cunha

Jurista explica ponto a ponto o equívoco de se aplicar esse modelo à educação fundamental


Escolas cívico-militares
Por Sérgio Sérvulo da Cunha, do Fórum da Cidadania de Santos | De Santos (SP)

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As palavras civil, civismo, cívico, civilização, civilidade, provêm todas do latim “civis”, e com elas se relacionam as palavras cidadão, cidadania, ligadas a “civitas” (cidade, Estado). Elas apontam para os laços que nos unem, a paz, a solidariedade.

Como cidadãos, todos temos direito à educação fundamental, e por isso o Estado se presta a fornecê-la (Constituição brasileira, arts. 205-214; lei de diretrizes e bases da educação).

Assim, (art. 205), “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”, devendo o ensino básico  ser obrigatório (art. 208, § 1°), comum (art. 210) e ministrado com atenção a alguns princípios, entre os quais “valorização dos profissionais da educação escolar” e “gestão democrática” (art. 206).

Todos nós somos cidadãos, mas nem todos somos servidores públicos.

Militares são servidores públicos pertencentes às forças armadas, as quais são organizações hierárquicas que se destinam “à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem” (Constituição brasileira, art. 142).

Preparando-se para sua carreira, todos que o desejem, e sejam legalmente admitidos, podem e têm o direito de frequentar escolas militares.
Mas, por exemplo, para que o oficial do exército possa saber qual função lhe cabe desempenhar, no programa da Academia Militar das Agulhas Negras deveria haver a cadeira “Direito Constitucional”, assim como a cadeira “História militar do Brasil”. Se não, alguém – que ignoramos quem seja – estará usurpando o ensino militar, e colocando-o a seu serviço.

Escolas militares são escolas profissionais, que nada têm a ver com o ensino fundamental. E, assim como ninguém pode ser obrigado a exercer uma determinada profissão, ninguém, de mistura com o ensino básico, pode receber de contrabando ensino específico, pertinente a uma determinada profissão. Ainda mais sendo este deficiente.

Por isso, nós civis somos gratos pelo desejo de colaborar que os militares manifestam, mas consideramos que, na sua especialidade, não há nenhuma virtude com a qual possam contribuir pedagogicamente para a formação da cidadania.

E os militares aposentados, que se pretende aproveitar fazendo uma boquinha nas “escolas cívico-militares”, não roubarão a vaga de profissionais especialistas em educação. Além de que, se eles fizessem parte do ensino básico, haveria o risco, sob a inspiração do seu padrinho, de ver as crianças andarem armadas, e o tiro incluído entre as matérias do curso (defesa pessoal).

O que, entre muitas outras coisas, significaria botarmos as famílias prá baixo do capacho.

Por essas e outras razões, são inconstitucionais as chamadas “escolas cívico-militares”.

Elas caracterizam desvio de função do militar, desvio de finalidade do ensino fundamental, e responsabilidade da autoridade competente (art. 208, § 2° da Constituição brasileira).



Imagem em destaque: ato na Câmara de Santos contra as escolas cívico-militares na educação básica. Foto: Apeosp



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