Um olhar sobre os povos que falam português

Exposição em Salvador reúne 70 fotografias que revelam as semelhanças e as diferenças entre sete países que têm a Língua Portuguesa como idioma

Por Alessandra de Paula, Assessoria de Comunicação do Ministério da Cultura

Setenta imagens de cenas teatrais realizadas em sete países que têm a língua portuguesa em comum, mas realidades territoriais, culturais e socioeconômicas bem diversas, estão expostas no Teatro Gregório de Matos, em Salvador, até este domingo, 7 de maio.

Trata-se da exposição fotográfica “Do Timor-Leste a Portugal: Um Olhar Brasileiro”, aberta ao público em geral e com entrada gratuita. A mostra reúne imagens registradas pelo fotógrafo Valmyr Ferreira durante oficinas de teatro, interpretação, improvisação, iluminação e caracterização realizadas gratuitamente em Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste e Portugal.

A exposição faz parte da programação cultural da X Reunião de Ministros da Cultura da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), iniciada nesta quinta, dia 4, e, para o fotógrafo, expor na CPLP é uma oportunidade de aumentar o intercâmbio entre os países e de mostrar ao público um pouco das diferentes realidades de locais que têm uma origem linguística comum.

Em alguns deles, Ferreira se deparou com a falta total de experiência dos alunos com artes cênicas. Em outros, testemunhou ricas vivências nessa área. Houve lugares, como Guiné Bissau, onde o fotógrafo viveu o desafio de fotografar sem luz elétrica.

“As fotos revelam as diferentes características dos países. Todos eles me marcaram muito. Éramos bem recebidos e me chamavam de ‘meu amigo brasileiro'”, conta Ferreira. Para ele, a CPLP tem uma importância muito grande no sentido de fortalecer as relações entre esses povos, possibilitando novas conquistas sociais, troca de conhecimento tecnológico e desenvolvimento econômico e humano, tendo como norte para as discussões as pessoas e suas necessidades fundamentais. “Acho que esse intercâmbio devia acontecer mais. Em qualquer esquina do Brasil, a gente ouve falar dos Estados Unidos e da Europa, mas não dos países de Língua Portuguesa, principalmente os africanos”, analisa.

DIVERSIDADE

A ideia da exposição foi da produtora brasileira Tania Pires e surgiu durante o Festival Internacional de Teatro da Língua Portuguesa (Festlip) de 2010, no Rio de Janeiro, evento que ocorre há dez anos, dirigido por Tania. “O teatro é uma manifestação livre, um experimento sem barreiras que permite a uma sociedade expressar seus costumes e linguagens. Quando falamos da língua portuguesa, falamos de nove países e quatro continentes de uma diversidade riquíssima e que, quando se unem por meio da sua língua, uma identidade comum se estabelece imediatamente, quebrando qualquer tipo de barreira. É no palco que nos desnudamos e nos unificamos”, ressalta a idealizadora do projeto.

As oficinas fotografadas por Valmyr foram oferecidas gratuitamente nos países e idealizadas por Tania, que selecionou currículos para formar as turmas de 25 pessoas, que se reuniam em centros culturais ou embaixadas do Brasil. Foram 12 dias em cada país e houve uma identificação imediata dos falantes da mesma língua durante as oficinas, mas em cada lugar as propostas apresentadas foram encaradas de forma diferente.

Tania conta um pouco das diferenças de trabalho com equipes de cada país, citando como exemplo as aulas de improvisação usando o texto O Pequeno Eyolf, do dramaturgo norueguês Henrik Ibsen, cuja história gira em torno de uma mulher dominadora que sustenta a família.

“No universo africano, a mulher tem papel de cuidar dos filhos, da casa. Foi complicado para as equipes nos países africanos lidar de outra forma com essa questão. Quando eu fiz a improvisação de uma mulher partindo para cima do marido, nenhuma mulher quis participar. Aí resolvi interpretar eu mesma a personagem mulher, e quase apanhei do ator que representava o marido. Conversamos e o homem me pediu desculpas. Só então as atrizes se animaram para participar da improvisação. Já em Portugal, quando propusemos a cena, o casal era formado por duas mulheres. Havia também uma cena de uma mãe que rejeita o filho. Nesse momento, foi muito doído para as mulheres africanas lidar com o tema. Com as fotos registradas, a gente consegue entender o que viveram naqueles momentos. É bonito de se ver”, relata a produtora.

ARTE DO IMPROVISO

Os realizadores das oficinas se depararam com o desafio de levar teatro para países com estruturas diversas. Em Guiné-Bissau, por exemplo, devido à instabilidade política, não havia luz elétrica em 2010. Valmyr Ferreira, que além de fotógrafo é iluminador cênico e deu aulas de iluminação nas oficinas, teve que improvisar para levar o trabalho adiante.

“Eu fui falar sobre iluminação cênica e não havia luz, nem refletores. A gente andava pelas ruas da Guiné e era tudo escuro, só havia um gerador ou outro. Fizemos a oficina dentro da embaixada do Brasil e construí com eles uma ribalta. Trata-se de um dos artefatos cênicos mais antigos que existe, uma caixa com várias lâmpadas, que ilumina os atores de cima para baixo. Fizemos a cena e as pessoas ficaram muito sensibilizadas. Elas descobriram que podiam construir um equipamento. Foi emocionante”, lembra Ferreira.

No Timor-Leste, o desafio foi fazer oficinas de teatro onde nem todos falavam a Língua Portuguesa, mesmo ela sendo a língua oficial. Quando a Indonésia ocupou o país, em 1975, o uso do português foi proibido, vigorando a língua Tétum. Segundo Tania, só agora as crianças começaram a ser alfabetizadas em português.

“Não tinha companhia teatral no Timor. A partir das oficinas, nasceram dois grupos de teatro. Deixamos um legado, grupos que representam o teatro timorense. Os movimentos culturais são importantes para que a Língua Portuguesa retorne aos países”, frisa a idealizadora.

Tania acredita que o teatro dos países de Língua Portuguesa se transformou com as oficinas. “Foi um pontapé oficial na profissionalização. Hoje, Angola tem mais de 20 grupos teatrais. A gente quer, em parceria com a CPLP, desenvolver outros projetos no sentido de formação e desenvolvimento humano”, completa.

SOBRE A CPLP

Criada em 1996, a CPLP é o foro multilateral privilegiado para o aprofundamento da amizade mútua e da cooperação entre os seus membros. Entre seus objetivos estão o reforço da presença dos países no cenário internacional, a cooperação mútua e a materialização de projetos de promoção e difusão da Língua Portuguesa. Tem oito países-membros: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

Na Declaração Consultiva da CPLP, os chefes de Estado e de Governo consideraram que a consolidação cultural que confere identidade própria aos países de Língua Portuguesa constitui um imperativo. Desde 2000, os ministros da Cultura da CPLP vêm produzindo recomendações sobre diversos temas que conformam os eixos estratégicos de cooperação cultural multilateral.

Além da exposição fotográfica Do Timor-Leste a Portugal: Um Olhar Brasileiro, a programação cultural da X Reunião de Ministros da Cultura da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) inclui espetáculos de teatro, exibição de filmes e oficinas gastronômicas, entre os dias 2 e 7 de maio.

  • Serviço
    Do Timor-Leste a Portugal: Um Olhar Brasileiro
    De 19/04 a 07/05
    Teatro Gregório de Matos – Praça Castro Alves, s/n – Centro – Salvador
    De quarta a domingo, das 14h às 19h
    Entrada gratuita
    Telefone: (71) 3202-7800

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